04 dezembro 2009

A familia Umbaraço!

Existe uma casa onde todas as pessoas que fazem parte dela tem apenas um braço. A casa da familia Umbaraço. Nessa casa todos precisam de todos porque só aos pares se sentem completos, o que lhes causa um certo embaraço.
A dona de casa apenas com um braço levanta-se e vai acordar a sua mãe para pedir o seu braço emprestado para esfregar os olhos e ver o relógio. Ambas se juntam e vão ao quarto do pai porque o relógio está no braço dele. O pai levanta-se e junta-se ao braço da filha para acordar a neta, a princesa Zaha. O braço da mãe abana a cama, o braço do avô mostra o relógio e a avó aponta para as horas.
Todos se separam e todos se juntam.
O avô tem a faca, a avó o queijo. A mãe o pão, a filha o sumo... da vida.
Todos se alimentam todos se contentam.
Todos vão às suas vidas.  Às vidas típicas de quem tem apenas um braço. Conduzir é complicado. Trabalhar é complicado. Enfim, viver é complicado. Toda a familia vive triste e enfastiada porque o mundo está injustamente feito para quem tem dois braços. Felizmente que para falar ao telemóvel só precisam de um braço. Na familia com um braço todos se telefonam vezes sem conta a contar as suas desventuras. Todos se telefonam, todos dizem o mesmo "A falta que o teu braço me faz. Ainda bem que existes. Não poderia viver sem ti."
Na casa da familia com um braço toda a gente depende de toda a gente.
À noite todos se juntam mas ninguém tem nada para contar porque passaram o dia a telefonar. À noite vêm a novela, de braços cruzados, em silêncio para ninguém se perturbar. Todos se olham de suslaio para ver se alguém precisa do seu braço. Quando um se levanta todos os outros se levantam para oferecer tudo o que tem... o seu braço.
O avô diz que está na hora de deitar e mostra o relógio. A avó aponta para as horas, a mãe indica o caminho, a neta pede um braço para se levantar do sofá. Todos rezam aos pares antes de se deitar para poderem juntar as mãos.
Todos rezam, todos imploram.
A mãe e a filha deitam os avós, a filha deita a mãe.
Todos se deitam, todos sonham.
Agora em solidão a princesa Zaha olha-se ao espelho e admira o seu corpo elegante, perfeito. Debaixo do seu vestido deixa ver o seu braço escondido e em simetria deixa cair as primeiras lágrimas de um pranto diário. Chora por ter dois braços, chora porque tem de o esconder. Chora porque não pode mostrar a quem ama como é. Como se sentiriam todos se soubessem que ela tem dois braços? Chora porque não precisando do braço de ninguém tem de viver como se não o tivesse. Chora porque vive toda a sua vida numa dependência que poderia não existir.
Deixemo-nos de tristezas. Hoje é dia da familia só com um braço receber os tios e primos que só têm um dedo.
(Texto que pretende proporcionar uma reflexão entre amor e dependência.)
Um agradecimmento muito especial ao "Jota" por partilhar comigo a sua história com a sua princesa Zaha.
Imagem: Pablo Picasso - 1904 - A rapariga com o corvo.

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